Por: Elio Gaspari, O Globo
Os dois homens mais procurados nos últimos 100 anos foram Osama bin Laden e Adolf Eichman. O gerente dos campos de extermínio nazistas foi achado na Argentina por um cego, e o chefe da al-Qaeda escondia-se no Paquistão numa fortaleza que só um cego não via.
Convertendo o cenário para o Brasil, Bin Laden vivia em Resende, na serra fluminense, a quinhentos metros da Academia Militar das Agulhas Negras. Sua casa era oito vezes maior que as propriedades da vizinhança e estava cercada por um muro de quatro metros de altura.
Afora essa excentricidade, um vizinho mais curioso poderia ter percebido que ela não produzia lixo. Se procurasse identificar o morador, saberia que a propriedade não tinha telefone nem cabo de internet.
É preciso muita boa vontade para se acreditar que Bin Laden não dispunha de algum tipo de proteção do poderoso aparelho de segurança paquistanês. Tanto para ele como para o governo americano teria sido muito melhor se tivesse morrido numa caverna de Tora Bora.
O terrorista preservaria a aura de ascetismo e os americanos ficariam livres da embaraçosa exposição dos militares paquistaneses como um aliado corrupto e traiçoeiro. Eles formam uma casta equipada com algumas dezenas de bombas atômicas.
Serão necessárias algumas semanas para que se saiba exatamente como os quatro helicópteros americanos chegaram a Abbottabad e o que sucedeu dentro da casa.
A cabeça do terrorista valia US$ 27 milhões em prêmios. Em menos de 48 horas derreteram-se as histórias segundo as quais Bin Laden estava armado e usou as mulheres como escudos.
Houve tiroteio com guarda-costas? O governo americano levou meses para reconhecer que Che Guevara foi executado por militares bolivianos com o beneplácito da CIA. De qualquer forma, jogando-se o corpo de Bin Laden no mar, queimou-se o arquivo.
Como 24% dos americanos acreditam que Obama é um muçulmano enrustido e 7% acham que Elvis Presley está vivo, será natural que milhões de pessoas vejam nessa história mais uma lorota do Grande Satan.
A operação que matou "Geronimo" entrará para a galeria da audácia militar. Vai-se saber como operava o agente que campanava a propriedade em Abbottabad e registrou a chegada do Suzuki branco do pombo-correio.
(No início dos anos 90 um agente da CIA vigiou um sujeito em Kartum, no Sudão. Ele só veio a saber que era o terrorista Carlos, o "Chacal", quando o capturaram.)
Obama presidiu com absoluto sucesso uma operação que, em ponto bem menor, assemelha-se ao desastre que marcou a humilhação do poderio americano.
Em 1979, a milícia iraniana ocupou a embaixada dos Estados Unidos em Teerã e aprisionou seus 52 funcionários. Um ano depois, o presidente Jimmy Carter autorizou uma ambiciosa operação militar. Seis helicópteros deveriam baixar nos jardins da embaixada e um comando libertaria os reféns.
Deu tudo errado. Pegaram até tempestade de areia, um helicóptero explodiu e a tropa regressou, para glória do aiatolá Khomeini.
Meses depois, Carter perdeu a reeleição para Ronald Reagan e o partido democrata ralou doze anos de amargura. O que era errado para Carter deu certo para Obama.
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