A inconveniência das doações eleitorais por empresas | Blog do Louremar

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

A inconveniência das doações eleitorais por empresas








Por: Márlon Reis
As eleições 2012 acabaram. Fora algumas pendências judiciais localizadas, os prefeitos e vereadores de todos os municípios brasileiros foram escolhidos e empossados.
Em muitos lugares, entretanto, o resultado eleitoral pode não ter sido alcançado da forma mais democrática. É que assistimos outra vez ao festival de doações feitas por empresas diretamente interessadas no resultado do pleito.
Empreiteiras, bancos e a indústria da mineração figuram sempre entre os maiores doadores. Todas têm em comum o fato de manterem relações estreitas com o Poder Público, cujas opções políticas e contratos definirão quem lucrará mais.
Segundo dados da Folha de S. Paulo (edição de 29.11.2012),  apenas três empreiteiras investiram R$ 151,7 milhões dos R$ 637,3 milhões recebidos pelas siglas. Trata-se de dinheiro doado diretamente aos partidos e que não se pode saber ao certo a que candidatos beneficiaram. Essa manobra é conhecida como “doação oculta”, já que priva os eleitores de saberem, antes do pleito, quem fora auxiliado pelas empreiteiras ao longo da campanha.

Nesse campo, o setor privado não é tão privado assim. Em lugar de se voltar à regulação, à prestação de serviços públicos e à elaboração de políticas de inclusão, o Estado se converte no principal provedor de empresas milionárias, recompensando-as por seus “serviços eleitorais” por meio de licitações fraudulentas ou da contaminação das decisões do Parlamento ou do Executivo.
O certo é que o dinheiro é decisivo para o alcance dos resultados eleitorais positivos. Estudo de Leany Barreiro Lemos, Daniel Marcelino e João Henrique Pederiva, analisando as disputas para a Câmara dos Deputados e para o Senado nos anos de 2002 e 2006 concluiu que “os candidatos vencedores gastaram, em média, cinco vezes mais do que os adversários” (“Porque dinheiro importa: a dinâmica das contribuições eleitorais para o Congresso Nacional em 2002 e 2006. Revista Opinião Publica”).
Isso significa, em linguagem clara, que o volume de doações impacta decisivamente os resultados eleitorais. Daí que a conquista dos grandes doadores pode ser a diferença entre a vitória e a derrota no pleito. E o pior é que, uma vez eleito, o beneficiário se sentirá obrigado a atender bem o seu doador. Assim pode ter esperança de voltar a ser ajudado nas eleições seguintes.
O resultado dessa relação é perverso e foi recentemente demonstrado em pesquisa realizada por Taylor C. Boas, F. Daniel Hidalgo and Neal P. Richardson, da Universidade do Texas: cada real doado ao longo das campanhas retorna às empresas doadoras multiplicado por 8,5.
Segundo os autores, “ao doarem para candidatos aptos a vencer as eleições, empresas brasileiras que prestam serviços ao poder público podem aumentar o valor recebido em virtude dos contratos com o governo durante o período legislativo subsequente. A extensão deste impulso nas empresas que atuam setor público – pelo menos 8,5 vezes o valor doado e possivelmente mais se for considerado todo o período do mandato, além do nosso intervalo de pesquisa de 33 meses – mantém relação com a taxa de propina que as empresas informam terem oferecido a políticos para a obtenção de contratos no passado. Neste sentido, os nossos resultados confirmam a sabedoria convencional de longa existência no Brasil. Segundo nosso conhecimento, no entanto, este estudo é o primeiro a demonstrar que o jogo da doações-por-contratos no Brasil se estende além dos incidentes bem divulgados que foram descobertos por investigações policiais e comissões parlamentares de inquérito. Para cada empresa e político pego em flagrante, há muitos mais, cujo conluio voa sob a tela do radar. Usar doações de campanha para comprar contratos de obras públicas faz – infelizmente, mas, provavelmente, não surpreendentemente -  parte integrante da democracia brasileira” (The spoils of victory: campaign donations and government contracts in Brasil. Hellen Kellog Institute for International Studies).

Muitos outros estudos nos ajudam a compreender essa conta que não fecha para a sociedade. Mas uma coisa podemos desde logo concluir: democracia não é isso. O objetivo das empresas é o lucro e essa essa meta de forma alguma é esquecida durante as campanhas.
Além dessas razões práticas, há razões constitucionais claras para se proibir doações com essa origem. Recentemente, a ministra Cármen Lúcia, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, afirmou que “não há por que empresa fazer financiamento de campanhas. Esse é um dado que precisa mesmo ficar às claras. Pessoa jurídica não deveria contribuir, porque não é cidadão”.
Com efeito, tramita no Supremo Tribunal Federal ação direita de inconstitucionalidade movida pela Ordem dos Advogados do Brasil em que se busca justamente a abolição da intromissão das empresas no financiamento das campanhas.
De qualquer modo, não haverá uma Reforma Política real sem a superação das graves distorções provocadas pelas doações por pessoas jurídicas. Precisamos, país, superar essa etapa que, ante os olhos da sociedade, já não mais possui qualquer justificativa.
Publicado no site Congresso em Foco, no dia 8/01/2013
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Juiz de Direito no Maranhão, membro do Comitê Nacional do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, um dos redatores da minuta da Lei da Ficha Limpa, coordenador e professor em cursos de pós-graduação, palestrante e conferencista. Twitter: @marlonreis

Um comentário:

  1. Agostinho Alves de Araujo.

    Caro Louremar....
    Importa lembrar que o Magistrado foi um dos redatores da lei da Ficha Limpa e um dos fundadores do Movimento pela aprovação desta Lei que começa a depurar a política do País. Parabéns ao Dr. Marlon Reis pelos atos de cidadania.
    Ainda Louremar, creio que, além do assunto tratado na matéria, faltam outras ações de grande importância para a consolidação da moral, ética e lisura na administração pública no Brasil.
    Uma campanha crucial que devemos empreender é a dos concursos públicos. Principalmente a nível municipal.
    Pois isto dará ao povo a liberdade necessária para votar em que mostra condições melhores de gerir a cidade. E não ser obrigado a eleger aqueles que lhes garantam cargos de nomeação por vontade do gestor.
    Esta medida colocará as pessoas em condições de votar com total liberdade, acabarão as negociatas e os "votos de cabresto".
    Outra santa solução Louremar, que nenhum político quer ouvir falar, é a que chamo de "Lei do Boné".
    Explico. A pessoa poderia exercer o cargo eletivo, condicionada a reeleição, dai teria que “”seguir carreira”, ou seja, somente poderia exercer cargo público diferente do último. Exemplo: O vereador poderia se reeleger, e depois teria que buscar outro cargo público que não a vereança. Ou ao menos esperar por 04, ou mesmo 08 anos para se candidatar novamente para o mesmo cargo.
    E mais, teria que se afastar de cargos de direção do partido político na mesma forma.
    A política não é profissão. A pessoa deve servir ao povo e depois “largar o osso”.
    Isto Louremar fará com que não existam mais os “caciques políticos”, os “profissionais da política”, pois tiraria toda a atratividade ilegal que a política representa.
    E o mais importante, condicionaria a que toda pessoa tivesse oportunidade para servir à sociedade através da política.
    E quem sabe, até mesmo diminuir estes altos negócios políticos que são pagos através das formas perniciosas apresentadas na matéria.
    Tudo isso deve começar pela própria Constituição Federal que não diz qual o conceito de cargo público eletivo. Quais seus princípios e objetivos sociais.
    Um forte abraço a você Louremar e parabéns pelo bom conteúdo do Blog.
    Agostinho Alves de Araujo.
    Alves e Araujo Advocacia

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