"Gente é pra brilhar, não pra soterrar"- Carlos Brickmann, para o Observatório da Imprensa
*Seul, Coreia do Sul. Um garoto pequenininho, daqueles que ainda têm o andar meio bambo, jogou no chão um papel de bala. Seu pai imediatamente pegou o papel, mostrou-o ao menino, foi até um cesto de lixo e jogou-o lá.
Mauro Chaves, num artigo clássico, perguntou por que os turistas brasileiros, na Suíça, não jogavam o maço vazio no chão, enquanto no Brasil os turistas suíços jogavam qualquer tipo de lixo na rua. Resposta: porque lá tem polícia.
*O governador paulista Geraldo Alckmin promete retirar dos rios Tietê e Pinheiros, até o fim do ano, 4,15 milhões de metros cúbicos de lixo (em engenheirês, "material assoreado"), que reduz o fluxo de água. Elogiou seus antecessores, do mesmo partido, que só em 2010 tiraram um milhão de metros cúbicos de lixo do rio. Traduzindo: não tiraram o suficiente. Havia mais lixo que ficou lá.
Imagine se o síndico de seu prédio, mesmo operoso em melhorias, deixa de cuidar da retirada de parte do lixo. Não vai dar certo.
*Há alguns anos, um advogado que cuidava da implantação de uma indústria européia de águas e refrigerantes no Brasil explicou que tudo tinha ficado muito fácil com a criação das garrafas de PET: desaparecia o custo do retorno do vasilhame, desaparecia o custo da lavagem, o preço da garrafa nova era embutido no preço e a Prefeitura ficaria responsável pela remoção do lixo. Em outras palavras, o custo da empresa era transferido para a Prefeitura - como é hoje. E multinacionais gigantescas olham para aquelas montanhas de garrafas plásticas que entopem bueiros e reduzem a vazão dos rios como se isso não fosse com elas.
E este não é um problema difícil de resolver (embora vá dar briga com supermercados, com as multinacionais, com os distribuidores): basta obrigar quem vende o refrigerante a comprar a garrafa de volta - como se fazia até há poucos anos. Se o cliente paga pelo casco e pode ser ressarcido, não irá jogá-lo no lixo.
*Há chuvas que, mesmo se todas as disposições legais tiverem sido cumpridas, irão provocar tragédias. Mas não tão grandes, nem tão mortíferas. Dê um passeio, caro leitor, pela rodovia Fernão Dias, que liga São Paulo a Belo Horizonte. O que há de barracos pendurados em morros, esperando apenas uma oportunidade para ruir e matar muita gente, é incrível. Sai caro tirar o pessoal de lá e colocá-lo em lugares decentes, em imóveis bem construídos - mas é mais barato do que reconstruir vidas e enterrar os mortos.
Não é o que se faz: em São Paulo (e não só em São Paulo) houve administradores que consideraram mais fácil autorizar invasões de áreas de risco. No Rio, quando a professora Sandra Cavalcanti quis tirar os barracos das encostas dos morros, houve até um show politicamente orientado em que a música principal era "daqui do morro eu não saio não". Profeticamente, dizia o poeta sobre seu barraco no morro: "Estou bem pertinho do céu".
É difícil, é complicado, exige a união de esforços de Governos, empresas, população. Mas ou se tenta algo nesse estilo ou continuaremos, verão após verão, a engrossar o volume das chuvas com as lágrimas das tragédias.
Como é mesmo?
A notícia passou batida, como se normalíssima fosse. Não deve ter nada demais, mas deveria ao menos despertar alguma curiosidade dos meios de comunicação. Vamos, porém aos fatos: o Banco Panamericano, aquele, acaba de inaugurar uma unidade em Piripiri, no Piauí. "Piripiri possui uma economia em desenvolvimento e esperamos com esta nova unidade estimular o crescimento da região. Com a nova loja, os interessados poderão conhecer mais de perto nossos produtos e ter acesso ao crédito de forma facilitada", explica Justus Laurentius, responsável pela unidade. O Panamericano financia imóveis, máquinas pesadas, automóveis novos e usados, motos, consórcios.
Os caros colegas que quiserem verificar as informações devem ligar para os telefones (86) 3276-3620 / (86) 3276-3384. Detalhe: tudo isso foi tirado do press-release do próprio Banco Panamericano.
De acordo, Excelência
O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, toca em dois temas da maior importância (e que, a propósito, já foram abordados nesta coluna): a proibição da propriedade cruzada dos meios de comunicação - a mesma empresa possuir, na mesma área, jornal, rádio, TV, Internet, sabe-se lá mais o quê, e assim exercer uma influência sobre a opinião pública que tende ao monopólio - e a concessão de emissoras de rádio e TV a políticos. São dois temas que merecem amplo debate - inclusive a parte da colocação do guiso no gato. Quem vai tirar as rádios e tevês da família de Sarney? E da família de ACM Neto? Quem vai peitar o deputado Henrique Alves para impedi-lo de usar verbas públicas para pagar reportagens amestradas falando bem dele em seu próprio jornal?
OK: o que não pode é o que ocorreu no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, que promoveu amplo debate sobre Telecomunicações entre jornalistas, funcionários do Governo e professores que pensam a mesma coisa. Há várias maneiras de preparar um bom sanduíche, e uma infalível para preparar um sanduíche ruim: a de colocar uma fatia de pão entre duas fatias de pão.
Bombeiro de plantão
O ministro Paulo Bernardo tem sido preciso, moderado, bem articulado quando fala em imprensa. Mas terá muito trabalho com alguns companheiros (daqueles grupos a quem o então presidente Ernesto Geisel chamava de "bolsões sinceros, porém radicais"). Já houve, por exemplo, bloqueio oficial a mensagens do jornalista Vitor Vieira, do blog Vide Versus. As mensagens de Vieira à Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul e ao Banco do Estado (Banrisul) foram rejeitadas pelos sistemas governamentais de informática, dificultando-lhe o exercício da profissão. Vieira bate duro: a seu ver, o bloqueio é "criminoso".
O portador das notícias
Marcos Cláudio Lula da Silva, filho mais velho do casal ex-presidencial, atacou pesadamente a Folha e O Globo por terem noticiado a concessão de passaportes diplomáticos à família Lula. Aliás, atacou também seus leitores ("jumentinhos"), disse que os artigos da Folha são "ridículos", disse que Folha e Globo são sempre "a escória do jornalismo sujo e sem fundamentos".
Seria a notícia falsa? Não, não era: o próprio Marcos Cláudio disse que era verdadeira e que iria devolver o passaporte diplomático. Então, qual é o problema, se a notícia contra a qual protesta é verdadeira?
Normal: uma das frases mais comuns de alguém que é apanhado em algo esquisito é "mas o jornal precisava publicar"? Se é verdadeiro ou falso, não importa: importa a divulgação do fato.
Contra a OAB, que exige a devolução dos passaportes diplomáticos, nenhuma palavra: a raiva só se concentrou nos jornais.
Criativo, informativo
Vale a pena ver a capa de 14 de janeiro do Diário do Comércio, de São Paulo, dirigido pelo jornalista Moisés Rabinovici: lembra os bons tempos do Jornal da Tarde (do qual, aliás, Rabinovici foi um dos astros). Uma belíssima foto daquela senhora que foi içada por uma corda e salva da enchente, com uma pequena chamada, uma legenda, e só: dá vontade de botar num quadro, como aquela capa do garoto chorando (foto de Reginaldo Manente) que o Jornal da Tarde publicou após a derrota do Brasil em Barcelona, no estádio Sarriá, que o eliminou da Copa.
Plágio na rede
Um portal da Web faz propaganda, disfarçada de reportagem, de uma dessas plantas emagrecedoras que entram e saem de moda em alta velocidade. O detalhe é que o portal se chama "Repórter Brasil" - o mesmo nome de um portal respeitado, muito mais antigo, pertencente a uma ONG que cuida de problemas relacionados a trabalho, especialmente o trabalho escravo.
Este colunista, atraído pelo nome "Repórter Brasil", abriu o link e deu de cara com a propaganda mais deslavada. Estão explorando um nome conceituado em benefício de produtos mágicos que prometem emagrecimento rápido.
Cuidado extra
A reforma ortográfica não exige dos jornalistas apenas a consulta aos dicionários para saber como é que as palavras devem ser escritas (se bem que, numa grande emissora de TV, apareçam legendas com a palavra "enchurrada"). A nova grafia exige também cuidado extra ao escrever, para evitar confusão.
Um exemplo (onde não há erro, mas a confusão é como se houvesse):
"Controlar para emissão de boleto da inspeção veicular em São Paulo"
Traduzindo: a Controlar, empresa que inspeciona a emissão de gases dos veículos em São Paulo, suspendeu a emissão de seus boletos.
À primeira leitura, fica bem difícil entender do que se trata.
A língua como ela é
Título publicado por uma revista virtual de um grande grupo:
"ETA declara cessar-fogo permanente contra Espanha"
Como é que se declara um cessar-fogo "contra" alguém?
Essas falhas se repetem: "A decisão cabe recurso", em vez de "A decisão admite recurso", ou "cabe recurso contra a decisão". Ou "Fulano baixou hospital" - só se estiver na Internet e baixar um jogo chamado Hospital. As pessoas podem "baixar ao hospital". Ou, melhor ainda, ser internadas no hospital, ser levadas ao hospital. Ou "corpo delito". Em latim, "corpus delicti" quer dizer "corpo do delito". Corpo delito só se alguém tiver um amigo chamado Elito que prefira não utilizar maiúsculas em seu nome.
Não é tão difícil aprender; nem é preciso mergulhar em livros gramaticais. O Manual de Redação é suficiente. Ou retomar o hábito de leitura, que faz milagres no uso correto do idioma.
Tenha seu corpo
A coisa passou meio batida, mas precisa ser ressaltada: saindo de seus afazeres, que devem ser múltiplos, o delegado geral de Polícia de São Paulo, Marcos Carneiro, proibiu o uso de expressões em latim nos boletins de ocorrência e em relatórios de delegados.
Claro, muita gente abusa. Defunto vira "de cujus", e se tiver morrido junto com os filhos eles serão "de cujinhus". "Ipso facto", "data venia", "venia concessa", "dura lex sed lex", tudo isso pode normalmente ser evitado. Mas como deve um delegado, a partir das determinações de seu chefe, referir-se ao habeas-corpus? Algo como "o suspeito tinha em seu poder um que tenha seu corpo preventivo"? O mais curioso é que o habeas-corpus foi criado na Inglaterra após o fim do Império Romano, e espalhou-se pelo mundo tendo como origem, se não falha a memória deste colunista, a Magna Carta (também latim, veja!) Habeas-corpus deve ser considerado latim, e portanto proibido, ou aceito como anglicismo - como chamar "media" de "mídia" e "premium" de "prímium"?
Como...
Legenda da foto de um grande portal noticioso da Internet:
"A russa Maria Sharapova comemora a vitória contra sua compatriota Elena Bovina vestindo um conjunto branco"
A foto mostra Maria Sharapova de blusa rosa e saiote marrom.
...é...
Nota num grande portal noticioso da Internet:
"Uma mulher na Polônia deu à luz gêmeos --um menino e uma menina-- e após fazer exames de paternidade, descobriu que cada criança é filha de um pai diferente. A informação é do site da revista Time.
"O menino é filho do marido da polonesa, e a menina é filha de um homem com quem ela supostamente teve um caso."
Tudo bem, tudo bem. Mas se o tal filho é comprovadamente de outro pai, que não o marido, como é que o caso extraconjugal é apenas "suposto"?
...mesmo?
Da Internet, que nunca nos falha:
"PM prende homem vestido de mulher em fuga"
Quem será o estilista que não apenas sabe como é o vestido de uma mulher em fuga como ainda foi capaz de desenhar o modelo?
Mundo, mundo
"Homem sobrevive a tiro na cabeça após espirrar a bala"
A versão oficial é de que a bala entrou por trás do olho e foi parar no nariz, sendo expulsa pelo espirro. Mas talvez possa ter acontecido algo semelhante ao que ocorreu com um antigo político brasileiro, que tomou um tremendo coice de mula na testa e sofreu apenas um machucado leve. Dizia-se, na ocasião, que a sorte do cavalheiro é que o coice não tinha atingido uma área vital.
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